26 de dezembro de 2011

Felicidade e frustração

"Pais e filhos têm pagado caro pela crença de que a felicidade é um direito. E a frustração um fracasso. Talvez aí esteja uma pista para compreender a geração do “eu mereço”.
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Me parece que é isso que tem acontecido em muitas famílias por aí: se a felicidade é um imperativo, o item principal do pacote completo que os pais supostamente teriam de garantir aos filhos para serem considerados bem sucedidos, como falar de dor, de medo e da sensação de se sentir desencaixado? Não há espaço para nada que seja da vida, que pertença aos espasmos de crescer duvidando de seu lugar no mundo, porque isso seria um reconhecimento da falência do projeto familiar construído sobre a ilusão da felicidade e da completude.
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E não por acaso se cala com medicamentos e cada vez mais cedo o desconforto de crianças que não se comportam segundo o manual. Assim, a família pode tocar o cotidiano sem que ninguém precise olhar de verdade para ninguém dentro de casa.
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Seria muito bacana que os pais de hoje entendessem que tão importante quanto uma boa escola ou um curso de línguas ou um Ipad é dizer de vez em quando: “Te vira, meu filho. Você sempre poderá contar comigo, mas essa briga é tua”."

Eliane Brum, na Época.

22 de dezembro de 2011

A flor mais bela do jardim

Nasceu da virgem, santa flor
A flor mais bela de um jardim
Que hoje floresce dentro em nós
Humilde amor



Santa flor

Fernando Guimarães | Thanizia Colares | Carlos Assunção
Com trecho de "Jesus, alegria dos homens", de J. S. Bach


Nasceu da virgem, santa flor
A flor mais bela de um jardim
Que hoje floresce dentro em nós
Humilde amor

E os três reis acompanharam
Seguindo a estrela do oriente
E encontraram com a luz
Divina luz

Neste momento tão sagrado
Vieram todos visitar
Presentearam com carinho
E alegria

Louvado seja a mãe do mundo
Bendito é esse menino
Filho do Pai, nosso senhor
E salvador

O galo cantou, a ovelha baliu
O boi berrou
A cabra pulou, a pombinha voou
O burro rinchou

E um sereno de luz
Regou toda terra
Anunciando aos pastores
Que nasceu Jesus


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Do CD "Cantilenas de Jardim" de Fernando Guimarães,
comprado no chão batido do cerrado, na Chapada dos Veadeiros

19 de dezembro de 2011

Os sacerdotes e seus oráculos

Está ficando cada vez mais óbvio nesse nosso mundinho do capital e consumo que crescimento não pode ser a balisa para supor a saúde de uma nação. Evidentemente isso só é levado à sério na periferia do poder. E só na pequena parcela da periferia que ainda se preocupa a pensar com os próprios botões. O centro ainda é absolutamente dependente desse conceitozinho nefasto - e por centro, tratamos aqui de todo sistema político-representativo e todo sistema de comunicação tradicional por um lado, e todos os grupo de concentração de capital por outro. A mídia, a politicada e as grandes empresas. Esses três elementos associados são o pacotão que promove economistas ao statutas que antes pertencia aos sacerdotes. São os novos oráculos que determinam o andar da carruagem.

Curioso é acompanhar os antigos sacerdotes nos seus (des)caminhos e, consequentemente, nos (des)caminhos de seus rebanhos, a massa que os segue, que os aceita como representantes de Deus na terra. Esses sacerdotes depostos do antigo posto de oráculos de uma nação, agora seguem os passos dos novos senhores da situação. Confusos no meio daquilo que o sistema do capital representa, pastores e suas igrejas passaram a acreditar piamente que o que rege agora todo nosso mundinho abestalhado deve certamente ser algum tipo de força cósmica superior que há de reger tudo mais, inclusive suas igrejas.

Os modelos de igrejas de sucesso são cópias exatas dos modelos das grande multinacionais. E o sonho, a motivação, os planos, os projetos de ambos também são os mesmos. É crescer, tornar-se grande, enorme, ir abocanhando a concorrência, abrindo franquias, controlando redes, hierarquisando, piramidando, controlando. O mundo econômico e o mundo eclesiástico andam hoje de mãos dadas, ambos esfomeados, insacialvelmente famintos, descontroladamente cavocando cada buraco de onde puderem tirar um pouco mais daquilo que lhes é mais sagrado. Aumentar o PIB. Cada um a seu modo.

Mas ainda tem sementes por aí, sendo levadas pelo vento aos mais improváveis lugares, e brotando, e brotando, e brotando. Flores de capim, que resistem ao fogo do cerrado e branqueiam o campo todo depois de cada queimação.

15 de dezembro de 2011

Sexo e capitalismo

"O capitalismo trivializou a paixão, fez com que as pessoas se desiludissem em relação ao amor. Isso leva a pensar que as relações sexuais são algo que se compra no mercado só para levar a vida adiante. O capitalismo tenta dissuadir a criação de vínculos reais. E valoriza demais o prazer. E, para a psicanálise, o prazer é sempre um problema. Qualquer pessoa que te venda um prazer fácil está mentindo. Se o que queremos é prazer profundo, com troca entre pessoas, ele será difícil, cheio de conflitos."

"A cultura liberal oferece mais escolhas do que havia antes. Mas o capitalismo cria a ilusão de que temos muitas escolhas, quando na verdade temos muito poucas. A única escolha é ser feliz ou não. É isso que está sendo vendido como o único programa: quanto prazer você pode ter, quão feliz pode ser. Só que felicidade pode ser como uma droga, nunca satisfaz, você quer sempre mais. Há coisas muito mais importantes que a felicidade: justiça, generosidade, gentileza."


Iara Biderman, na Folha.com, afanado do Pavablog.

12 de dezembro de 2011

Corajosamente

A calamidade avança galopante
Indiscutivelmente
Enquanto prossigo galante
Abestalhadamente silente
Como não fora com a gente
O caos que permeia o espaço
Outrora são e forte
Agora abatido e doente
Desacorsoadamente
Deitado em seu leito de morte
Esperando, quem sabe, com sorte
Que alguém encare de frente
A sombra que como o poente
Derrama escuridão somente
Sobre toda e qualquer semente
Pra que não brote da terra esperança
Enquanto prossegue a matança
De tanta criança inocente

Quiçá me levante agora
E rompa essa besta corrente
Arrebente já, sem demora
Ostracismo insano e demente
E enlouquecidamente
Como o sol rompendo na aurora
Me lance em volumosa vertente
De luz rebentando na flora
Fazendo eclodir a semente
Que a sombra sofocou lá fora
Trazendo vida novamente
À bestidão prevalente
Tingindo de cores o cinza
Com canções egolindo gemidos
Levante do chão os oprimidos
E ombro a ombro comigo
Caminhemos de peito aberto
E então corajosamente
Acabemos com esse deserto

8 de dezembro de 2011

A moita onde Deus se esconde

No desenrolar do tocante livro de Enio R. Mueller (Caminho de Reconciliação - a mensagem da bíblia | editora Grafar), o autor vai descortinando aos poucos aquela que é a desconcertante forma que Deus parece ter escolhido para revelar-se através daquilo que viria a ser conhecido como Bíblia.
[ No velho testamento ] Uma análise atenta do movimento geral da narrativa bíblica mostra um gradual desaparecimento de Deus. No Sinai, Moisés ainda vê Deus face a face, embora seja o único a quem é dado este privilégio, e ainda que tenhamos que pensar na nuvem que envolve Deus neste encontro. Mais adiante, Deus diz a Moisés que ocultará o seu rosto; como vimos Moisés só pode ver Deus pelas costas. A última alusão, na narrativa bíblica, de que Deus tenha se revelado a um ser humano foi com Samuel (1Sm 3.21). A última vez em que é dito que Deus "aparece" a um ser humano foi com Salomão (1Rs 9.2). O último milagre público é registrado em 1 Reis 18-19, onde Deus também não aparece a Elias, a não ser na brisa leve que sopra. O último milagre particular é registrado em 2 Reis 20:1-11, com o caso da sombra que muda de lugar diante de Isaías e Ezequias. Por fim, no livro de Ester, já no pós-exílio, Deus não é mencionado sequer uma vez.

(...)

[ Na vinda do messias ]
A necessidade de uma revelação especial para perceber que aquele era o Messias [não foi carne nem sangue que te revelou...], deve levar a pensar. Sua manifestação era ao mesmo tempo sua ocultação. Vários elementos o sugerem. Seus pais ainda não eram formalmente casados. Em sua genealogia são mencionadas quatro mulheres de reputação duvidosa. E quem imaginaria o rei messiânico nascendo numa estrebaria? "De Nazaré pode sair alguma coisa boa?", chegou a se perguntar um potencial discípulo (Jo 1.46). E de que serve um messias morto numa cruz?

(...)

[ No surgimento do Espírito Santo ]
  Deus revelado num ser humano é o lugar em que Deus melhor pode se esconder. A vinda de Deus no Espírito representa uma radical ocultação de Deus. Agora Ele se esconde nos subterrâneos do nosso espírito.

O esvaziamento, a ocultação, a dissolução de Deus em algo cada vez menos palpável, observável e analisável evidencia-se ainda de forma definitivamente assombrosa quando nos lembramos que o mandamento do Deus 'escondido' em Cristo é de que nós, que somos agora a derradeira moita onde Deus se oculta, devemos nos dissolver como sal que se dispersa e some para temperar.

Quando "Deus" está em evidência, e parece ser esse o sonho de todos os cristãos na sua correria por visibilidade, representatividade, milagre, poder e glória, é certamente de um outro deus que estamos falando, que não o Deus da Bíblia. O Deus revelado no imprevisível e cativante livro sagrado, está disperso, escondido, diluído e desaparecido, epecialmente nos cantos onde menos se espera.

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Veja também:
No olho de quem olha
Em todos os cantos

5 de dezembro de 2011

Prenhe

O homem de Nazaré me foi apresentado como Filho de Deus. Ouvi as histórias sobre ele desde pequeno, e ainda muito novo brotou em mim uma convicção estranha e inexplicável de que era mesmo. Durante toda minha vida o segui mais ou menos de perto (às vezes bem de longe). O Filho de Deus! E essa característica singular era tão incrível que ofuscava todas as outras.

Eu já era um homem barbudo e pai de família quando percebi que aquele ser divino vinha aos poucos tornando-se homem diante de mim. Foi tardiamente que o conheci da forma mais usual com que referia-se a si mesmo: Filho do Homem. Fui descobrindo aos poucos que ele era carne acima de tudo. Que era sangue, suor, lágrimas, hálito. Que chorava, sofria, sentia-se indignado e enfurecido com a opressão e a hipocrisia dos religiosos, impaciente e incorformado com a apatia de seus amigos mais próximos, profundamente enternecido com corações sinceros mesmo que confusos em seus passos trôpegos. O poder do Filho de Deus diluiu-se na limitação do Filho do Homem.

Então chega dezembro e de repente me dou conta de que antes de tudo ele foi um bebê frágil e completamente dependente dos cuidados de gente como eu. Pais, avós, tios, vizinhos e amigos o embalaram, limparam, ensinaram a andar, falar, assobiar, plantar bananeira e dançar cantigas de roda. E me ocorre agora, que ainda antes de tudo, o Filho de Deus era um feto à espera da luz - e esse pensamento ao mesmo tempo me assusta e me enche de esperança de que em breve chegue o dia em que ele verdadeiramente nasça dentro de mim.


"Nasceu da virgem santa flor
A flor mais bela de um jardim
Que hoje floresce dentro em nós
Humilde amor" Fernando Guimarães

1 de dezembro de 2011

Missão - salvar crianças-bruxas

"Nas páginas desse livro-documentário você encontrará todos os elementos das famosas estórias de ficção da literatura contemporânea: uma jornada ao mundo do nada, a revelação de grandes mistérios em meio a uma cultura de muito misticismo, onde anjos e demônios seguem à sombra de feiticeiros, bruxos, anciãos e sacerdotes do bem e do mal, todos envolvidos no desaparecimento de milhares de crianças; até que uma verdadeira operação de resgate invade o domínio das trevas, visita seus templos e dá início à batalha para libertar as "crianças-bruxas" da África cristã. A diferença é que, nesse caso, não há ficção de nenhum tipo. É tudo real. E não serve para nos distrair, pois esse livro é um documento missionário e antropológico da decadência religiosa do século XXI. Sim! Está acontecendo do outro lado do atlântico... agora!"


"Quando a gente pensa que é cultural, tribal, pagão e milenar; fica evidente que é religioso, cristão-folclórico e pós-moderno. Quando pensa que é religioso, então percebe o pano de fundo absolutamente cultural. Quando finalmente se conclui que é religioso-cultural, vê que tudo não passa de máfia e tráfico. É business! É grana! É mercado!"

De todos os absurdos humanos que vemos em todos os cantos do planeta, este está certamente entre os mais cruéis e insanos. E as vítimas são crianças. Entre no site para conhecer mais do trabalho e, quem sabe, adquirir um exemplar do livro ou colaborar de outras formas.