7 de novembro de 2012

Vacas magras

As magras vacas que pastam em meu jardim ruminam torrões de terra.

Eu observo da varanda os ângulos pontiagudos de suas ancas magras, e as marolas desenhadas no corpo pelas ripas das costelas.

Terra seca paira no ar.
O Horizonte é pó.

O ipê amarelo secou e os canteiros de íris murcharam arfando ofegantes até a morte.

Eu oro ao Deus da minha infância na esperança de vê-lo ao menos fazer brotar o orvalho durante a madrugada escura que se aproxima.

Mas o breu da noite chega bafejando seco e o mormaço da madrugada alonga a escuridão por cem anos.

Quando o sol finalmente rompe a barra negra do horizonte, derrama sobre o solo ressequido seus inclementes raios amarelos, queimando a planta de meus pés enquanto racha a terra em fatias enormes.

Sob o som crepitante de ossos partidos o solo rude e insaciável engole as vacas, e o ipê, e as íris.

Resta agora em meu jardim somente terra seca, chão batido, pó e minhas últimas gotas de suor.

Não sei porquê permaneço em pé.
Não sei porquê não fui tragado.
Mas sei que na varanda, alheia ao espetáculo apavorante,
ainda descansa, coberta de pó, minha velha enxada.

3 comentários:

  1. em meio a tanta desolação, descansa a enxada...

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  2. "Eu oro ao Deus da minha infância na esperança de vê-lo ao menos fazer brotar o orvalho durante a madrugada escura que se aproxima...

    Resta agora em meu jardim somente terra seca, chão batido, pó e minhas últimas gotas de suor. Não sei porquê permaneço em pé."

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