- Sô ruim de luta, mas bom de briga - disse o velho enquanto batia o pó da roupa e secava o suor da testa. E por conta do meu silêncio e do meu olhar de espanto, continuou: - É que luta exige toda uma pensassão prévia, todo um treinamento, toda uma estratégia, toda uma aporrinhação que não me guento de passar. E nem tempo tenho pra isso tudo. Tenho boca pra encher, e preciso um dia todo correndo pra dar conta. Então deixo a luta com os meninos aí. Agora, espera esquentar a água pra ver quem vem rebentar com tudo. Quem segura os óme. Quem para os trator, ranca os tratorista pra fora. Quem para na frente da escavadeira. Quem se deita no chão. Isso é brigacêra mesmo. Tem que ter cabelo branco. A cara marcada. Porque cada marca nessa cara aqui é um fiapo a menos de paciência e uma tora a mais de coragem.
- Mas, no fim, derrubaram as casas todas mesmo - argumentei estampando o desânimo nos olhos.
- Essas aí, filho, essas aí. Mas vai ter outras. Os óme não param de derrubar. De ir jogando a gente pros cantos. Não tenho mais casa agora, mas amanhã vou ter, e depois de amanhã aparece alguém com essas entregação de posse. Entregação mesmo porque os óme quer que a gente entregue tudo. Deixam a gente no pelo. Mas pode vim. Paro na frente de novo. Até lá vou ter mais umas tantas marcas na cara. Umas tantas toras. Haja trator pra derrubar.
- E não cansa, isso?
- Cansa pra burro. Mas é assim. Viver cansa. Pra isso que serve as varanda e as rede. E a cuia de mate. E se não tem varanda tem os pé-de-sombra. Lugar pra amarrar uma rede não falta - e apontou pra trouxa onde tinha embolado o pouco que conseguiu tirar da casa antes dela ir abaixo. Foi quando reparei que era uma rede que embrulhava tudo. E o velho agarrou a trouxa com a mão firme, jogou nas costas, por cima do ombro, e saiu caminhando, sem parar de falar: - Agora é correr atrás da comida e de um lugar pra amarrar a rede. Lugar não falta. Eles que venham...
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