16 de janeiro de 2025

A cabana e o vulcão

A cabana na Reserva Nacional Mocho-Choshuenco, Chile - 2025

Vi a mesma cabana de 27 anos atrás. Era janeiro, eu estava noivo, me casaria em maio, e fiz essa viagem com meu grande amigo e parceiro de roubadas Alexandre, e o Du Bois, uma espécie de professor de montanha que se tornou amigo também. Sem grana, sem internet, sem celular, sem GPS, sem equipamento pra gelo, quase sem informação. A viagem tem muita história, mas vou me manter nessa da cabana. Em parte dela, porque essa também é longa. 

Dois dias antes estávamos em Constituición, litoral do Chile, onde abrimos mais de uma dezena de vias em maravilhosas falésias do Pacífico. Mas queríamos neve, gelo, vulcão, cordilheira. Decidimos pelo vulcão Mocho-Choshuenco, na comuna de Panguipulli, longe do roteiro turístico tradicional.

É onde estou agora, 27 anos depois, acompanhado da minha esposa e uma amiga. Tanta coisa aconteceu nessas quase 3 décadas, e a cabana continua lá. Também seguem firmes as duas casinhas do pueblo de Enco onde naquele passado distante ganhamos um pão quentinho e alguns tomates de um menino, depois de 4 ou 5 dias no vulcão, o último deles sem comida. O pão com tomate mais delicioso da história. As mesmas casas, a mesma cabana. Quantos anos teria hoje o menino que nos trouxe pão?

Hoje vim de carro até a entrada do Parque, peguei informações sobre as trilhas demarcadas, escolhi uma segura que vai até onde agora tem um abrigozinho de montanha e começam as rampas de neve e gelo no verão. Na primeira vez não tinha carro, não tinha parque, não tinha trilha marcada. Só tínhamos um mapinha mal impresso e um ônibus caindo aos pedaços que tivemos que empurrar na rodoviária de Panguipulli. O mapa indicava que, do ponto final à cabana, teríamos que percorrer 4 km. Dali pra cima não sabíamos nada.

Campos de gelo - 27 anos atrás

Começamos a andar no fim da manhã, as mochilas cheias, pesadas, e nada de cabana. Descobrimos depois que houve uma falha de impressão naquele mapa mequetrefe que sumiu com um número 2 antes do 4. Tivemos que andar 24 km e só chegamos na cabana tarde da noite. Tínhamos planejado acampar e descansar um dia no pé do vulcão para subir no dia seguinte, mas a cabana estava aberta e dois montanhistas chilenos estavam lá. Nos receberam, deixaram entrar e era um espetáculo - quentinho, com colchão, lareira, cozinha - mas eles iam iniciar a escalada naquela madrugada. Não podíamos perder a companhia, já que da cabana pra cima não tínhamos mais muita informação.

Hoje, quando contei a uns chilenos que encontramos na trilha que 27 anos atrás eu tinha ido à pé do ponto final até o cume sem nenhum equipamento de gelo, como quem sobe o Anhangava na Serra do Mar paranaense, eles sorriram educadamente. Certamente vão contar por aí sobre o brasileiro mentiroso que encontraram na trilha. Mas, como diria Chicó, só sei que foi assim.

A greta, com o Alexandre já fora dela, final do século passado

Acordamos de madrugada e acompanhamos os chilenos até uma rampa íngreme de gelo ainda na base do vulcão. Lá eles deram meia volta e desceram. Disseram que não tinha como atravessar, que seria preciso crampons, encordamento, bastões e não sei mais o quê. Nós ficamos. Sacamos um único bastão de esqui que achamos na cabana e trouxemos pra trilha, que mais parecia uma vareta de barraca, e saímos picando gelo, degrau por degrau, até atravessarmos a rampa toda. Por baixo de nós corria um rio de degelo onde algumas vezes, no gelo mais fino, afundávamos os pés. Foi um processo, lento, demorado e assustador. Depois da rampa seguimos por enormes campos de gelo, rampas mais e menos íngremes de neve às vezes mais fofa, às vezes mais firme, blocos de rocha, vários falsos cumes, até alcançarmos o ponto mais alto do Mocho. Eu quase morri de canseira. Cheguei a desistir e dizer para meus companheiros seguirem sem mim. Mas não deu 10 minutos e eles voltaram dizendo que o cume estava ali pertinho - e fui e chegamos lá os três.

Dentro da cratera, no cume

Hoje a neve estava bem mais recuada. A maior parte da trilha foi por um bosque belíssimo e um campo florido, e o destino era um mirante ainda perto da base.

27 anos atrás, depois do cume, resolvemos descer por outro caminho, para evitar a rampa de gelo que era bastante apavorante. Hoje, conversando com o guarda-parque, descobri que o trecho que escolhemos descer no final do século passado, é uma grande glaciar com 60 metros de altura de gelo acumulado. Quando passamos por lá tinha havido uma nevasca enorme e rara em pleno verão que cobriu a geleira e o campo florido. Passamos por cima dela sem nem saber da sua existência, a não ser pelo momento em que o Alexandre desapareceu. Só ouvimos o grito. Quando nos aproximamos devagar vimos ele entalado em uma rachadura na nave. Era um buraco sem fundo, talvez, como soube hoje, com 60 metros! Eu e o Du Bois tínhamos passado por ali tranquilamente, mas quando o Alexandre passou a neve cedeu. Graças a Deus era uma fenda estreita e ele entalou. Não tínhamos corda nem nada. Pra tirar ele de lá tiramos nossas roupas, amarramos uma na outra e puxamos ele. Ainda bem que não contei isso pros chilenos. Ia ser demais.

Os campos floridos em 2025

Hoje, com a Sandra, minha esposa, e a Paula, nossa amiga, parei bem antes. Adquiri, com o passar dos anos, uma dose de bom senso mais razoável. Vontade de seguir subindo não faltou, mas hoje ninguém mais faz o que se fazia há 27 anos.

Tem sinal - 2025

14 de janeiro de 2025

Cerro Castillo - Patagônia chilena

Fiz uma peregrinação a um templo sagrado. Um que foi erguido há 65 milhões de anos diretamente pelas mãos de Deus. O chamam Cerro Castillo (Monte Castelo), mas para mim era um templo, o maior e mais majestoso já construído.

Os peregrinos que iam chegando depois de horas de caminhada, quando concluíam o último trecho, faziam a última curva e davam de cara com a indescritível imensidão do Castillo, fossem cristãos, ateus, agnósticos, muçulmanos, candomblecistas, fossem o que fossem ou não fossem, tivessem ou não qualquer tipo de fé, paravam, estáticos, boca entreaberta, ombros prostrados em adoração, muitos, como eu, com os olhos cheios de lágrima e, em silêncio reverente, caminhavam lentos até onde pudessem sentar e ali ficavam, estarrecidos diante do altar.

Deus, que prefere se revelar nos pequeninos, nos enfraquecidos, fragilizados, empobrecidos, nos que não tem o que comer ou vestir, nos que não tem onde reclinar a cabeça, ali decidiu revelar-se em toda a sua glória e majestade.

O cenário todo era espiritual. O altar do templo era imensidão de neve, glaciares, tortuosas corredeiras de degelo e rochas em tamanhos e ângulos impossíveis. A abóbada era o azul celeste infinito e o piso uma lagoa verde esmeralda salpicada de centenas de milhares de pontos de luz piscante como um céu absurdamente estrelado em plena luz do dia.

Um condor solitário e sublime cruzou o céu entre nós e a montanha naquele exato instante, surgindo não sei de onde e encenando uma dança de louvor ao Eterno.

Não havia nada a ser dito. Nenhum salmo, nenhum hino, nenhuma oração. Diante da presença do criador, o silêncio e as lágrimas sutis eram a única forma possível e inevitável da adoração.

Mas nós tínhamos que descer. Teríamos ainda horas de trilha pela frente. Quando virei as costas para a montanha e dei os primeiros passos, tive a impressão de ouvir o coro de dez mil anjos, cordas e metais entoando hosanas. Talvez fosse só o barulho do vento. Ou a presença pulsante de Deus, que descia a montanha em mim.

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A descrição do Cerro Castillo como templo foi uma tentativa de dizer um pouco do que verdadeiramente senti quando estive lá. Mas foi só um lado da história. Naquela descrição omiti algo que quero agora mencionar.

Diante de toda aquela beleza indizível senti também horror e desespero. Entre as lágrimas de louvor e gratidão escorriam também algumas de profunda angústia. Porque diante de mim havia um glaciar que vinha encolhendo ano após ano graças ao aquecimento global provocado por uma espécie específica de mamíferos.

Todas as grandes transformações do nosso planeta foram provocadas por catástrofes naturais. Até hoje. Estamos agora diante de uma tragédia aceleradamente provocada por nós mesmos.

Nós que, feitos à imagem e semelhança do criador, criamos arte, poesia, música, culturas incríveis, vastidão de conhecimento. Nós que criamos medicina e medicamentos e vacinas e salvamos centenas de milhares de vidas. Nós que praticamos atos de bondade gratuita, que produzimos justiça, inventamos democracia, agimos de forma altruísta em atos heróicos de bravura e graça, também nos entregamos à estupidez, idiotice, ganância, egoísmo e pusemos tudo a perder. Nos jogamos ensandecidos em uma cruzada de destruição e morte e autoflagelo e autofagia e extermínio mútuo e de tudo mais.

Nós, que diante do altar entoamos louvores, nos lançamos às colunas do templo e as destruímos em troca de miudezas, e agora o templo todo desaba sobre nossas cabeças.

30 de setembro de 2024

A imagem do Cristo em mim


A lembrança mais remota que tenho de minha existência é a imagem de um cachorrinho de plástico, branco e amarelo, pendurado em meu berço, balançando sobre minha cabeça, e a voz de uma mulher que canta:

"Jesus escuta, a voz terninha, da criancinha, em oração..."

Não vejo exatamente o rosto dela, mas ouço sua voz com muita clareza, e sinto o toque dos seus dedos na minha pele macia, na penugem dos cabelos.

Não sei quantos anos tinha. Não consigo colocar essa memória em uma linha do tempo. Não sei em que casa era. Mas ouço. Há quase 50 anos ouço essa voz e essa canção.

"... E também sabe, dos seus intentos, e pensamentos, do coração"

Esse ano completo meio século de vida. E de um jeito ou de outro, com maior ou menor intensidade, Jesus de Nazaré foi sempre a referência em torno da qual circulei. Sei, e sempre soube, que isso nasceu daquela voz, sussurrando pra dentro de mim uma beleza indizível, imensurável, amorosa e redentora, e me revelando que o nome dessa beleza é Jesus.

Nesse meio século procurei Jesus em livros, retiros, encontros, reuniões, nas muitas conversas com muita gente boa, no serviço, no acolhimento, no relacionamento com o outro, na teologia. E, de muitas formas, O encontrei em cada um desses lugares.

Mas, ainda hoje, 50 anos depois, se estou carente, se estou triste, se estou sozinho, se estou com medo, se estou com dor, como a dor que agora sinto, que é saudade, que é distância, que é ausência do que temo um dia perder, se careço da beleza indizível, imensurável, amorosa e redentora que me sussurrou aquela voz, se quero Seu abraço, Seu hálito, Seu afeto, não sei de forma melhor para encontrá-lO do que, sozinho em algum canto, fechando os olhos, ouvir de novo aquela voz, aquela canção.

No fim das contas, meio século depois, descubro que a imagem mais intensa, profunda e presente do Cristo em mim está na minha primeira memória de infância. Na voz doce da minha mãe.

❤️

8 de julho de 2024

Walden | Thoreau

Foto: www.chirpbooks.com


Em 2022, na rebarba final da pandemia, li Walden junto com a rapaziada do saudoso clube do livro que existiu e resistiu durante alguns anos aqui na cidade. Fiquei tocado, de capa a capa. Diz muito sobre meu eu profundo, que ainda arfeja sob os entulhos acumulados do cotidiano capitalista que nos engole sem dó. Hoje fui lembrado do livro pela mulher que amo. Corri para reler minas notas e fui novamente esbofeteado pelo espanto original. Achei interessante publicar aqui, nesse lugar onde ninguém mais habita, mas que ainda alimento com sobras para não deixar morrer.

Walden - A vida nos bosques
H. D. Thoreau

A maioria dos luxos e muitos dos chamados confortos da vida não apenas são dispensáveis como são, com efeito, obstáculos à elevação. Com relação a luxo e conforto, o sábio sempre viveu uma vida mais simples e frugal que o pobre. Os filósofos antigos, chineses, hindus, persas e gregos eram uma classe como não havia outra tão pobre em riquezas exteriores, nem tão rica em riquezas interiores. Não sabemos muito sobre eles. E notável que nós saibamos tanto sobre eles quanto sabemos. O mesmo é verdade para os reformadores e benfeitores mais modernos de suas raças. Ninguém pode ser um observador imparcial ou sábio da vida humana fora do terreno privilegiado do que nós deveríamos chamar de pobreza voluntária. De uma vida de luxos, o fruto é luxo, seja na agricultura, no comércio, na literatura ou na arte. (p18)


Não faz muito tempo, um índio andarilho foi vender cestos na casa de um conhecido advogado da minha região. "Quer comprar alguns cestos?", ele perguntou. "Não, não queremos nenhum cesto", foi a resposta. "Como assim!", exclamou o índio ao sair pelo portão, "quer que a gente morra de fome?". Vendo que seus industriosos vizinhos brancos estavam bem de vida e que o advogado só precisava tecer argumentos e, como por mágica, conquistava riqueza e posição, ele havia pensado: vou fazer negócio - faço uns cestos, é uma coisa que sei fazer. Pensou que, depois que os cestos estivessem prontos, sua parte estaria feita, e caberia ao branco comprá-los. Ele ainda não tinha descoberto que era necessário fazer que comprar seus cestos valesse a pena para o outro, ou pelo menos fazer que o outro assim pensasse, ou fazer alguma outra coisa que o outro julgasse valer a pena comprar. Também teci uma espécie de cesto de delicada tessitura. mas não consegui convencer alguém de que valia a pena comprá-lo. E, não obstante, no meu caso, julguei que valia a pena tecê-los, e em vez de estudar como fazer para que os outros homens julgassem que valia a pena comprá-los, preferi estudar como evitar a necessidade de vendê-los. O tipo de vida que os homens apreciam e admiram como bem-sucedida é um só. Por que exaltar um único tipo de vida em detrimento dos outros todos? (p22)


Cuidado com qualquer empreitada que exija roupas novas e não um novo homem dentro das roupas. (p26)


Toda geração ri das modas antigas, mas segue religiosamente as atuais. (p28)


No estado selvagem cada família possui um abrigo da melhor qualidade possível, e suficiente para suas necessidades mais primitivas e simples, mas creio que falo com fundamento quando digo que, embora as aves no céu tenham seus ninhos, e as raposas suas tocas, e os selvagens suas wigwams, na sociedade civilizada moderna menos da metade das famílias possui casa própria. Nos grandes centros e cidades, onde a civilização predomina especialmente, o número de pessoas com casa própria é uma fração muito pequena do total. O resto paga todos os anos uma taxa por esse traje externo a tudo, que se torna indispensável no verão e no inverno, cujo valor daria para comprar toda uma aldeia de tendas indígenas, mas que agora ajuda a manter o cidadão pobre pelo resto da vida. Não pretendo aqui insistir na desvantagem de ser inquilino em comparação a ser proprietário, mas é evidente que o selvagem é dono de seu próprio abrigo porque custa muito barato, enquanto o civilizado aluga em geral porque não tem o suficiente para comprar; nem, no longo prazo, para alugar nada melhor. (...) E quando o agricultor se torna proprietário de sua casa, talvez não se torne mais rico, porém mais pobre, e talvez a casa é quem seja sua proprietária. (p32-34)


Essa é a lei universal... fazer uma ferrovia ao redor do globo acessível a toda humanidade é o equivalente a aplainar toda a superfície do planeta. Os homens tem uma noção instintiva de que se continuarem com essas ações, de bolsas e pás, por tempo suficiente, acabarão chegando a algum lugar, quase na mesma hora, quase de graça; mas, embora uma multidão se aproxime da estação e o condutor grite "Todos a bordo!", quando a fumaça é soprada e o vapor condensado, acabarão percebendo que alguns estão acomodados, mas o resto está sendo atropelado - e isso se chamará, e será, "um acidente melancólico". Sem dúvida, poderão partir enfim aqueles que pagaram passagem, isto é, se sobreviverem até lá, mas provavelmente já terão perdido a elasticidade e o desejo de viajar nessa altura da vida. O desperdício da melhor parte da vida ganhando dinheiro para desfrutar uma liberdade questionável durante a parte menos valiosa da vida me lembra do inglês que foi à Índia fazer fortuna primeiro, para depois voltar à Inglaterra e viver como um poeta. Ele deveria ter subido para o sótão desde o início. "O quê?", exclamam um milhão de irlandeses vindo de todos os barracos da região. "Você está dizendo que essa ferrovia que nós construímos não é uma coisa boa?". Sim, respondo, comparativamente boa, isto é, podia ter sido pior; mas eu preferiria, como vocês são meus irmãos, que tivessem aproveitado melhor seu tempo, não cavando esta lama. (p50)


[ sobre juntar coisas ] Excederia as forças de um homem saudável hoje em dia pegar sua maca e andar (Jo 5.8). (p62)


Há costumes de algumas nações selvagens que talvez possa ser proveitoso imitarmos, pois ao menos guardam uma semelhança com a troca de pele anual: possuem a ideia da coisa, seja ela realidade ou não. Não seria bom se celebrássemos o busk, ou "festa dos primeiros frutos", como Bartram descreve ter sido costume dos índios muclasse?" Quando uma aldeia celebra o busk", ele diz, "depois de vestirem roupas novas com novas panelas, frigideiras e outros utensílios domésticos e outros móveis, eles reúnem todas as roupas velhas e outras coisas indesejáveis, varrem e limpam as casas, praças e toda a aldeia de toda sujeira, que juntam a todo cereal velho e toda provisão restante em uma mesma pilha, que se consome em chamas. Depois de ingerirem uma droga, e jejuarem por três dias, apagam toda fogueira que houver na aldeia. Durante o jejum, eles se abstém da gratificação de todo e qualquer apetite ou paixão. É proclamada anistia geral: todos os malfeitores podem voltar à aldeia. "Na quarta manhã, o sumo sacerdote, esfregando madeiras secas, acende uma nova fogueira em praça pública, a partir da qual cada casa da aldeia é suprida com uma chama nova e pura. Então fazem um banquete com o milho novo e os primeiros frutos e dançam e cantam por três dias, e nos quatro dias seguintes recebem visitas e festejam com os amigos das aldeias da região, que da mesma forma se purificaram e se prepararam". (p63)


O vento da manhã sopra eternamente, o poema da criação é ininterrupto, mas poucos são os ouvidos que o escutam. (p76)


[ Questionando o 'ter' ] Havia sido um homem rico sem prejuízo da minha pobreza. (p74)


A manhã é quando estou desperto e dentro de mim existe uma alvorada. A reforma moral é o esforço de se espreguiçar para se livrar do sono. Por que será que os homens pouco se dão conta do dia quando não dormiram? Eles não são tão ruins em fazer contas. Se não estivessem dominados pela letargia, teriam feito alguma coisa. Milhões estão acordados o suficiente para o trabalho mas apenas um em um milhão está acordado o suficiente para um esforço intelectual efetivo, e apenas um em cem milhões para uma vida poética ou divina. Estar desperto é estar vivo. Ainda não conheci ninguém desperto. Como eu poderia olhar em seus olhos? (p80)


Se não buscarmos nossos dormentes, forjarmos nossos trilhos, e dedicarmos dias e noites remendando nossa vida tentando melhorá-la, quem construiria as ferrovias? E se a ferrovia não ficar pronta, como chegaremos ao céu a tempo? Mas se ficarmos em casa e cuidarmos de nossa própria vida, quem haverá de querer ferrovia? Nós não usamos a ferrovia: a ferrovia é que nos usa. Você alguma vez pensou no que são aqueles dormentes em trilhos? Cada dormente é um homem, um irlandês ou um ianque. Trilhos foram postos sobre eles, e eles estão cobertos de areia, e vagões deslizam suavemente por cima deles. São dormentes pesados, eu garanto. E a cada par de anos um novo lote é deitado e lhe passam por cima de modo que, se alguns têm o prazer de correr sobre os trilhos, outros têm a infelicidade de passar por cima deles. E quando atropelam um sonâmbulo, um dormente extranumerário na posição errada, e o acordam, subitamente freiam o trem, e fazem alarde e choram, como se fosse uma exceção. (p82)


Dificilmente um homem cochila meia hora depois do jantar, mas quando ele acorda, ergue a cabeça e pergunta: "Alguma novidade?" como se o resto da humanidade tivesse ficado de sentinela. Algumas pessoas podem para ser acordadas a cada meia hora, sem dúvida com o mesmo intuito então, como recompensa, contam-nos seus sonhos. Após uma noite de sono as novidades são tão indispensáveis quanto o desjejum. "Por favor, contem alguma novidade que tenha acontecido com alguém em algum lugar do mundo" e ele lê, durante o café com pão que um sujeito teve os olhos arrancados hoje de manha no rio Wachito; sem sequer sonhar que ele mesmo vive na escuridão da caverna insondável deste mundo, e também tem apenas olhos rudimentares. (p83)


Trata-se de uma experiência surpreendente e memorável, além de valiosa, perder-se na floresta em algum momento. (...) Só depois que nos perdemos, em outras palavras, quando perdemos o mundo, começamos a nos encontrar, e a nos dar conta de onde estamos e da extensão infinita das nossas relações. (p151)


Deveríamos voltar para casa sempre de longe, de aventuras, e perigos e descobertas, todos os dias, a cada dia com uma nova experiência e um novo caráter. (p181)


Se o dia e a noite são tais que você saúda com alegria, se a vida emana uma fragrância como a de flores e ervas de perfume adocicado, se é mais elástica, mais estrelada, mais imortal - eis o seu sucesso. Toda natureza se congratula consigo, e você momentaneamente pode se sentir abençoado. (p188)


Cada homem é construtor de um templo, que é seu corpo, ao deus que ele adora, a partir de um estilo puramente seu, e do qual ele não pode escapar esculpindo em mármore em vez de a si mesmo. Somos todos escultores e pintores, e nosso material é a nossa própria carne, nossos próprios sangue e ossos. Qualquer nobreza começa imediatamente a refinar o semblante de um homem; qualquer baixeza ou sensualidade, a embrutecê-lo. John Farmer sentou em sua soleira uma noite de setembro, após um dia duro de trabalho, a cabeça um pouco ainda no trabalho. Depois do banho, ele se sentou ali para recriar seu homem intelectual. Havia esfriado um pouco, e alguns vizinhos estavam apreensivos esperando geada. Nem bem embarcara em seus pensamentos quando ouviu alguém tocando uma flauta, e aquele som se harmonizou com seu estado de espírito. Ele continuou pensando no trabalho; mas o fardo desse pensamento, embora continuasse em sua cabeça, e ele se pegasse fazendo planos e elucubrando contra a própria vontade, pouco lhe importava. Não passava de pele seca, constantemente descamada. As notas da flauta chegaram à sua casa, em seus ouvidos, vindas de uma esfera diferente daquela em que ele trabalhava, e sugeriam um trabalho a certas faculdades que nele estavam adormecidas. Delicadamente, aquelas notas fizeram desaparecer a rua, a vila, e o estado em que ele vivia. Uma voz disse a ele: Por que você fica aqui e vive essa vida dura e mesquinha, sendo possível uma existência gloriosa? Aquelas mesmas estrelas brilham sobre outros campos além desses. Mas como sair dessa condição e migrar efetivamente lá? Só para conseguiu pensar em praticar alguma nova austeridade, para fazer que a mente influísse em seu corpo e o redimisse, e tratar a si mesmo com um respeito cada vez maior. (p192)


E, ai, cuidar da casa!, deixar brilhantes as maçanetas do diabo, e esfregar suas banheiras neste dia claro! Melhor não ter casa para cuidar. Digamos, morar no oco de uma árvore; e ali ter como visitas matinais e festas noturnas, apenas um Pica-Pau. (p195)


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A paginação mencionada está baseada na versão da Edipro, de 13 de fevereiro de 2020, com tradução de Alexandre Barbosa de Souza.

27 de junho de 2024

Jesus e os Direitos Humanos

Essa ano a gente tá organizando, através do coletivo O Amor Vence, um Ciclo de Conversas com o tema Jesus e os Direitos Humanos. Serão 4 encontros com 4 subtemas: Pobreza, LGBTfobia, Machismo e Racismo. Cada encontro conta com a participação de 2 convidados - um militante do tema e outro para fazer a ponte entre o tema e Jesus, criando canais de diálogo, apoio e mobilização. Fiquei responsável por fazer essa ponte no tema 2, LGBTfobia. Abaixo a transcrição da minha fala.

2º encontro do Ciclo de Conversas Jesus e os Direitos Humanos


Jesus e a LGBTfobia

Vamos começar pelo começo, que é, na verdade, a única coisa que importa aqui na minha fala. Porque se o tema é Jesus e os DH, e a minha parte da fala é a parte focada em Jesus, interessa saber o que ele disse sobre o tema. E todo resto da discussão teológica ou da espiritualidade cristã deve ser filtrado pelo que ele disse. A bíblia é mãe de todas as heresias. Todos os horrores produzidos pelo cristianismo ao longo da história, cristianismo como religião, como instrumento de poder, de manipulação e controle de massas, como ópio do povo, tudo tem por trás argumentos retirados de textos bíblicos. Texto descontextualizado, é claro, texto distorcido, fruto de leituras mal intencionadas ou mal informadas, ou preconceituosas ou tudo isso junto. Por isso, pra falar de texto bíblico, é preciso ter uma referência, uma base, um fundamento a partir do qual a gente interpreta o texto e tenta tornar ele relevante para hoje. E se nosso interesse é falar de Jesus e os Direitos Humanos, a referência, a base, o fundamento tem que ser Jesus. Se não for ele, então a gente tá interpretando o texto a partir de outras coisas que não se podem chamar exatamente de cristãs.

E o que ele disse sobre esse tema?

Antes de saber o que, bom saber o contexto. Porque quando se fala em sexualidade, é muito presente o argumento de que hoje as coisas são piores do que eram no tempo de Jesus, e que hoje o mal e a devassidão e a perversão estão tomando conta do planeta e tal. Por isso é bom saber como as coisas eram no tempo de Jesus.

Jesus é um cidadão judeu, que cresceu na cultura judaica, com todas as suas referências morais e consequências éticas que são, até hoje, a base do que chamam por aí de valores judaico-cristãos. E era do interior, cresceu numa vilazinha que devia ser super conservadora como sempre são, ao longo de toda a história da humanidade, até os dias de hoje, todas as vilas e cidades interioranas, isoladas da efervescência das metrópoles.

É lá na vila de Nazaré que ele faz sua primeira fala pública, lendo o texto do profeta Isaías que diz: 

“O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu para pregar o Evangelho aos pobres. Ele me enviou para proclamar a libertação dos aprisionados e a recuperação da vista aos cegos; para restituir a liberdade aos oprimidos e anunciar o ano da graça do Senhor” (Lucas 4).

Restituir a liberdade aos oprimidos, diz Jesus, e fazer os cegos, os que estão cegos pelo seu moralismo e seus preconceitos, verem. E ele diz que ele é o cara a quem o texto se refere. O pessoal que cresceu com ele, que conhecia ele desde piá, fica furioso, quer matar ele como herege, mas não mata. 

E dali ele sai e segue. 

Sai do interior conservador, fechado, protegido, moralista, e vai pras fronteiras. Zebulon e Naftali, Galiléia dos Gentios. E depois pra Cesaréia de Filipe, cidade profundamente romanizada. Se afastando dos ambientes onde viviam majoritariamente as famílias tradicionais de Israel com sua moralidade judaica e indo pras fronteiras mal vistas e mal faladas, onde havia todo tipo de influência estrangeira e pagã, com forte presença da cultura greco-romana, com as casas de banho, e sacerdotisas dos templos pagãos, as relações entre os jovens servos e seus senhores que vinham desde a Grécia antiga em um contexto de sexualidade absolutamente distinto do contexto judaico. Rolava de tudo. E Jesus vai pra lá. Mas, indo, não leva discurso moralista nenhum. Não tem nenhuma agenda moral. Ele não vai lá pra defender a família tradicional judaica da devassidão romana, não! Ele vai amar, e curar, e tocar, e aceitar, e perdoar toda aquela gente. E anunciar o ano da Graça do Senhor - uma referência ao Jubileu.

E aqui faço um aparte só pra comentar - vc nunca viu nem verá um amontoado de cristãos conservadores moralistas fundamentalistas defensores de família reunido na câmara dos vereadores pra defender a ideia do jubileu! Lutando por esse preceito bíblico mosaico, pra restaurar ele na nossa nação porque, afinal de contas, Deus acima de todos e tal. Sabe porquê? Jubileu é o perdão de todas as dívidas. Jubileu é a redistribuição de terras, de igual pra igual, pra todos. Pra anular o pecado do acúmulo de riquezas! Aconteceria a cada 50 anos, segundo a Lei de Moisés - a mesma Lei que serve de base para todo o tipo de fala preconceituosa e violenta dos ultraconservadores fundamentalistas. Esse é o Jubileu, o ano da Graça do Senhor. Já viu algum cristão conservador de extrema direita falar disso? Não viu nem verá porque o fundamentalismo moralista é profundamente seletivo e interesseiro. 

Mas vamos voltar pra devassidão romana. Sabe o que Jesus encontra lá, no meio da balbúrdia pagã? Uma fé que jamais havia visto em Israel - é o que ele mesmo diz pra um centurião romano e pra uma mulher cananéia. Eu, que nos últimos anos tenho rodado por aí, do lado de fora dos muros protegidos das igrejas, posso dizer o mesmo. Vejo aqui gente com uma fé muito maior do que a que encontro nos templos. Gente que acredita e luta por um mundo mais justo - o ano da graça do Senhor. A jornada de Jesus pra longe do ambiente protegido da moral e bons costumes judeus foi sem nenhuma cruzada moral. Só com amor e graça.

E nesse contexto, sabe o que ele diz sobre os LGBT? 

Nada. A não ser por uma rápida referência que vou comentar mais tarde.

Fora isso não diz nada porque nada tem a dizer, apesar de andar pelas cidades romanizadas onde valia tudo. Ele não tem medo da cultura grega, da moral romana, porque Ele ama. E onde há amor não há medo. O perfeito amor, lança fora todo medo - disse Jesus. Onde há amor, há acolhimento. Onde tem medo, tem cruzada, tem inimigo, tem arma, tem porta trancada, tem discurso inflamado de ódio, de desprezo, de nojo, de eliminação do outro, de julgamento e condenação do outro. Onde tem amor tem porta aberta, coração aberto, braço aberto, abraço, choro, perdão, alegria, dança, comunhão. Onde tem amor tem Deus, tem Jesus. Onde tem medo, não - nem um, nem outro.

Mas então porque tanta raiva, porque tanto medo, porque tanto nojo, porque essa cruzada moralista? E aí a gente chega num movimento político. No ressurgimento de uma agenda de extrema direita que é toda ela baseada no medo - medo de perder os privilégios de séculos e séculos de dominação do homem branco hétero etc, etc. Esses caras têm medo! O medo mobiliza eles, e eles sacaram que a melhor arma que eles têm é espalhar o medo por todos os lados. Pânico moral! Unir todos ao redor de um pavor comum. Então eles criam fantasmas e monstros e espalham por aí o terror. Era o que acontecia na Idade Média, foi o que aconteceu no nazifascismo europeu e a gente achava que não tinha como acontecer de novo até que chegaram os celulares e as mídias sociais. E aí os caras transformaram essas ferramentas tecnológicas em plataformas de difusão de medo - através da mentira e da desinformação.

A agência LUPA fez uma série de reportagens esse mês por conta do Dia Internacional contra a Homofobia, Transfobia e Bifobia -  Arco-íris sob ataque. Foi uma investigação sobre os caminhos do preconceito contra LGBTQIAPN+ nas redes, analisando 11mil publicações em 12 meses. Abaixo um resuminho:

  • As duas expressões principais: Família Tradicional como a encarnação da perfeição e a 'Ideologia de gênero' como a encarnação do mal.
  • A difusão massiva de teoria conspiratória de que as pessoas LGBT+ se uniram não só nas Américas, mas em todo o planeta, para atacar — e acabar — com a “família tradicional” composta por um homem e uma mulher.
  • Ataques ao filme da Barbie, associando-o à pedofilia.
  • Ataques à Educação sexual nas escolas, acusando-a de 'doutrinação gay' (sendo que 80% das violências sexuais são praticadas por parentes próximos - educação sexual protege famílias, protege crianças!).
  • Há conteúdos que "explicam" as cores da bandeira LGBT+ associando-as a Satanás, sodomia e mutilação sexual.
  • A agenda 2030 da ONU é divulgada como "um governo mundial" disposto a "semear a ideologia de gênero entre as crianças".
  • Acusações — explícitas e implícitas — de que as pessoas LGBT+ querem perverter as crianças são constantes, com hashtags tipo #LutaContraAMáfiaPedófila ou #ComMeusFilhosNãoSeMeta e falando de uma imaginária "normalização da pedofilia".

Os caras acreditam em tudo isso. Se deixaram engolir pela mentira e desinformação e estão apavorados, adoecidos e enlouquecidos. E é mais que desinformação, tem um abundante conteúdo de ódio, de incitação à violência. O que é meio óbvio mesmo, porque ódio e violência são filhos do medo, consequência dele. Quem tem medo mata.

“Pelos frutos os conhecereis”, diz Jesus. Os frutos dos que se acham defensores da família têm sido medo e ódio, pânico, adoecimento de alma. 

Enquanto isso, Jesus diz ainda hoje o que disse 2mil anos atrás, na rápida referência que mencionei antes:

“Nem todos podem receber esta palavra, mas só aqueles a quem foi concedido. Porque há eunucos que assim nasceram do ventre da mãe; e há eunucos que foram castrados pelos homens; e há eunucos que se castraram a si mesmos, por causa do reino dos céus. Quem pode receber isto, receba-o” (Mt 19:11-12). 

Eunuco, literalmente, era o cara que servia o harém. Subjetivamente, era um homem sem interesse por mulheres, ou alguém não hétero (lembre-se que a ideia contemporânea de homossexualidade não existia na época de Jesus, nem, obviamente, a expressão LGBTQIAPN+, mas as pessoas com essas condições humanas existiam). 

Jesus elenca três tipos de eunucos: (1) literalmente castrados por homens (para servir o harém), (2) castrados com algum tipo de voto de celibato (por causa do reino do céu) - importante lembrar que pra esse negócio de celibato funcionar, o celibatário deve ser a letra 'A' das letrinhas acima, de assexual, que é quem tem pouca ou nenhuma atração sexual - e (3) nascidos do ventre da mãe. 

Ora, o que se propõe aqui é que além de homens e mulheres, temos uma outra possibilidade. Jesus está falando o óbvio, porque sempre existiu gente assim, com uma sexualidade não heteronormativa. É a simples e objetiva constatação da realidade, como disse Silvio Almeida no discurso de posse no Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania: “vocês existem e são importantes para nós”. O que disse Silvio Almeida, a igreja ainda não tem coragem de dizer. Ou a parte fundamentalista e moralista da igreja, que, infelizmente, é a barulhenta maioria, ainda não tem coragem de dizer.

Mas sabe uma coisa que a igreja fundamentalista, moralista e barulhenta diz? Ela diz o Salmo 139, e o diz com muito orgulho: “Tu criaste o íntimo do meu ser e me teceste no ventre de minha mãe. Eu te louvo porque me fizeste de modo especial e admirável. Tuas obras são maravilhosas!” (Sl 139).

Se “há eunucos que assim nasceram do ventre da mãe”, não foram eles igualmente criados e tecidos de modo especial e admirável? Não são igualmente obras maravilhosas das mãos de um Deus que é amor? Algum cristão teria coragem de dizer que esses eunucos foram criados no ventre da mãe por demônios ou coisa parecida? Se são obras das mãos de Deus, teria Ele os feito para que fossem agredidos, calados, silenciados, convidados a se anularem, a não serem quem foram feitos? Se foram feitos assim, não seriam naturalmente assim? Se assim são naturalmente, forçá-los a não serem o que são não seria contrariar a natureza, contrariar a criação, contrariar, portanto, o autor da criação?

Há quem diga que aceita uma pessoa LGBT+ desde que sua sexualidade seja anulada, afogada, represada, não praticada. O cara se esquece que a sexualidade humana é fisiológica! Não se anula ela assim num passe de mágica. Paulo, que era solteirão e aparentemente mantinha algum tipo  de voto de castidade, sabia disso, porque isso é óbvio, por isso ele aconselhava a rapaziada dizendo: “gostaria que todos fossem como eu (...) mas, se não conseguem controlar-se, devem casar-se, pois é melhor casar-se do que ficar ardendo de desejo”. E isso vale pra todo mundo, hétero e não hétero, cada um na sua condição. 

Jesus cita três personagens distintos: o que foi feito eunuco pelo homem, o que se faz pelo reino, o que foi feito no ventre da mãe. São três personagens diferentes. Não há condenação sobre nenhum deles. Os três são naturalmente mencionados e naturalmente aceitos. Porque não se muda o que se é, como bem frisou Jeremias: 

“Porventura pode o etíope mudar a sua pele, ou o leopardo as suas manchas?” (Jr 13).

No início dos Atos dos Apóstolos, Filipe é colocado diante de um eunuco. Depois de ouvir sobre o amor de Jesus, perdão, reconciliação, graça, acolhimento, etc, fortemente tocado, quebrantado, maravilhado, enternecido, emocionado, o eunuco pergunta: "O que me impede de ser batizado?". A resposta é simples e direta: "Nada o impede".

Nada impede! Nem ao eunuco do harém, nem ao eunuco do reino, nem ao eunuco do ventre da mãe. Não há impedimento algum. Não há discurso moralista algum. Não há condenação alguma. É claro que não, porque somos todos “feitos de modo especial e admirável”, somos todos “obras maravilhosas” das mãos de Deus.

A porta de entrada do Reino é o amor. Aos que odeiam se dirá, “apartai-vos de mim, porque nunca os conheci”. Aos que amam, “vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo”

Porque #OAmorVence.


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