17 de dezembro de 2007

A noiva e o jardim

Em um reino distante havia uma bela noiva, ansiosa por casar-se, mas seu noivo lhe disse que antes das bodas ainda teria que fazer uma longa viagem. Um jardim rude e selvagem cercava a casa do noivo, e ele amava aquele lugar mais que tudo que possuía. Antes de sair para sua difícil jornada, chamou sua noiva, tomou-a pelas mãos e pediu-lhe que cuidasse do jardim até sua volta, e o regasse, podasse, livrasse-o do capim e das ervas daninhas, mantivesse-o vivo, ainda que com o aspecto rude que ele possuía, porque quando retornasse, o próprio noivo trataria do jardim e o tornaria o mais belo de todos os jardins de todos os reinos. Ao final de todas as recomendações, tocou os lábios da noiva com os seus e partiu.

No dia seguinte, a noiva foi até o jardim e dedicou-se a ele como seu noivo havia feito enquanto esteve lá. Mas, com o passar dos dias, percebeu que o jardim lhe roubaria a beleza. Suas mãos começaram a sujar, as unhas lascavam, a pele ressecava ao sol. Sementes de capim aderiam ao seu vestido, espinhos e pedras feriam-lhe mãos e pés. Decidiu poupar-se, temendo que o noivo não a aceitasse mais na sua volta. Entrou na casa rodeada pelo jardim, e tratou de cuidar de si, horas em frente a um espelho, ungindo-se com óleos e perfumes.

No lado de fora, dia após dia, ervas daninhas e capim cresceram e avançaram em direção a casa. Entravam pelas frestas e abraçavam a casa com mil tentáculos, lacrando portas e encobrindo janelas. Logo o sol já não encontrava espaço para iluminar a noiva. A casa se tornou escura e úmida. Mofo e bolor cresciam nos cantos e o ar tornava-se fétido. A noiva, no entanto, permanecia tratando de si, iluminada agora apenas por uma pequena vela, alienada de tudo que acontecia à sua volta. Na penumbra, já não via mais seu próprio rosto, agora pálido, nem as olheiras profundas que se formavam e lhe davam um triste aspecto doentio. Imaginava-se ainda bela e viçosa, enquanto as ervas e o bolor tomavam conta de todo ambiente.

Quando o noivo voltou, encontrou o jardim abandonado e mal podia ver sua casa debaixo de densa vegetação. Do lado de dentro, sua noiva jazia morta, enfraquecida pela escuridão e sufocada pelo bolor. Então, profundamente entristecido, o noivo olhou para o corpo inerte, a casa destruída e o que restara do jardim. Enquanto vagava os olhos úmidos pelo local, encontrou algumas minúsculas flores brancas escondidas entre as ervas e o capim. Seguiu abrindo caminho na vegetação e recolhendo as flores que encontrava espalhadas, invisíveis naquele matagal. Encontrou milhares delas, e as colheu, e juntou-as em um lindo buquê. Amando-as intensamente, tocou-as com seus lábios enquanto, juntas, tornaram-se elas mesmas a mais bela entre todas as mulheres.

Ali mesmo ele a desposou e, em seguida, transformou aquele lugar no mais belo jardim que jamais existiu.

2 comentários:

  1. Texto teu? Ou saiu de algum conto-de-fadas?

    Dá pra ver que você é um cara embebido em literatura, em belas narrativas. Obrigado por nos brindar sempre com belos textos.

    Posso inferir que a parábola se refere a Cristo e a Igreja? Ou estou deveras "viajando na maionese"?

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  2. Certamente vc não está viajando na maionese. ;-)

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