O que me incomodou no texto do Raoni, no entanto, não está relacionado com o conteúdo ou com a conclusão. Me senti incomodado pelo título. De tudo que se possa pensar sobre o livro que escrevi, de bom e de ruim, algo que me parece um franco e profundo engano, ainda que muito bem intencionado, é que seja ele fruto de uma ousadia. Esse título pressupõe coragem, tem ares de bravura nobre, de alguém que luta contra um gigante. Talvez seja exagero meu e isso não tenha passado nem perto da cabeça do Raoni, mas preciso esclarecer, nem que seja pra mim mesmo: não houve ousadia alguma da minha parte.
Escrevi o livro sentado em cadeira estofada, giratória, com rodinhas, apoio de braço e amortecedor pneumático. Tive por várias vezes em mãos uma cuia de tererê com limão ou um copo de nescau gelado. Nos dias quentes, um ventilador gostoso me refrescava. A janela dava de cara pra um matão lindo, de onde me alisava uma brisa fresca, e podia ver o pôr do sol atrás das belíssimas montanhas que separam os bairros Garcia e Velha. Escrevi invariavelmente por prazer, mesmo quando cansado e sonolento. Não houve em momento algum ato de bravura envolvido na produção do livro. Quando publicado eu já era, como descrito pelo Brabo no prefácio, um sujeito que não ia mais à "igreja" e, portanto, nada tinha a perder. Ningué poderia me demitir, não cairia nas mão de nenhum conselho, presbitério ou sinédrio, não seria chamado a nenhuma sala pastoral pra me explicar, não teria que deixar de dar aula na escola dominical... absolutamente nada haveria de me acontecer, como absolutamente nada me aconteceu.
Deixemos a virtude da ousadia repousar sobre os largos ombros de gente que a merece. Paulo de Tarso e suas chicotadas. Lutero e seus bate-bocas. Madre Tereza e Gandhi. Os exilados políticos do regime militar. A irmã Dorothy e o Zé Castanha no Pará. As famílias do Pinheirinho. Aquele chinês louco e anônimo na Praça da Paz Celestial. Há, enfim, milhares de ousados espalhados por aí, levantando a voz e expondo o peito em nome da justiça, do amor, da igualdade. Não eu.
De qualquer forma Raoni, meu velho, fico feliz que tenha gostado do livro, e agradeço pelo texto.
Tuco,
ResponderExcluirTeimo em comentar que a ousadia vista por Raoni é a mesma vista por mim (este que espera ainda apalpar um destes exemplares que foram tão deliciosamentes gerados).
Ela esteve contigo quando você quis chorar e não chorou, pelo que presenciou, e também quando chorou. Quando cansado em dar murros em ponta de faca resolveu fazer sozinho. Talvez bem cedo quando ainda criança, certamente mais tarde quando jovem.
Enfim não venha esconder o ouro, pois também nos tornamos homenzinhos capazes de discernir certas virtudes em varões de valor.
Abraços fraternos
Blz Roger. Não vou negar sua capacidade de discernir :P
ResponderExcluirTuco, ousadia teve o cara, meu, de escrever elogios ao teu livro pra Ultimato...
ResponderExcluirVerdade Rubinho. Essa foi a verdadeira ousadia.
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