11 de dezembro de 2008

O vento

Vivemos em um tempo de controle total. Tá tudo dominado, diria o poeta do funk. Desde a dor de cabeça, que aliviamos com analgésico, passando pela temperatura do escritório, do quarto e do carro, devidamente condicionada, até a proliferação da espécie (graças à Deus). Sabemos previamente quando e para quantos filhos haveremos de entregar esse mundo mal cuidado para que, se tudo der certo, eles dêem um jeito na porcaria que andamos fazendo. Um final de semana prolongado pede consulta à meteorologia. Se não aceitarem o cartão, temos cheque. Se não aceitarem o cheque, um bocado de dinheiro vivo pra prevenir. Tudo absolutamente sob controle. Tudo planejado. Planejamos nosso futuro com planos de saúde, seguros, aplicações e previdências. Lutamos para evitar toda e qualquer possibilidade de solavanco no percurso.

O inesperado é nosso maior terror!

Na ânsia por um mundinho seguro direcionamos nosso tentáculos de controle e posse também para o mais imponderável dos alvos. Queremos (o cúmulo da pretensão) ter Deus sob controle. Daí vem a teologia alienada, os compêndios de doutrinas, as 4 leis espirituais, o apelo evangelístico que, se aceito, garante uma vaga no céu, o curso de batismo, a romaria dominical aos púlpitos sagrados, as correntes e os jejuns. Tudo em busca do controle e da segurança. Se eu fizer tudo direitinho, vai dar tudo certo. Metemos Deus no bolso, como nosso talismã. Temos ele todinho explicado em nossa cartilha e nos muitos cursos que fizemos e ainda faremos. Estigmatizamos os dons, transformamo-os em cargos, organizamo-os em ministérios e planejamos o calendário anual.

Nos resta, agora, aplicar a receita e papar o bolo.

A loucura que nos incomoda, que é nossa pedra no sapato, é a contragedora observação revelada nas desorganizadas páginas do novo testamento. O Cristo nos é revelado inesperado, intempestivo e selvagem como Aslam. Não se pode prever um passo daquele que, há dois mil anos, tentamos desesperadamente conter e controlar. Afirmam que o Espírito é vento. E onde anda o vento? Para onde vai? Quem o controla? Quem o mantém? Quem o retém?

Vento retido não é vento. Vento só é vento quando em movimento. E quanto maior e menos previsível ele é, tanto mais conhecemos sua força e tanto mais dobramo-nos diante de sua glória. Minha esperança e oração é que o vento seja forte o suficiente para me livrar do controle, rasgar as velas, arrancar o timão de minhas mãos, colocar-me à deriva. Tento, ao menos, convencer-me disso. Mas sei que minha alma anseia mesmo é pelo porto seguro, quente e confortável, que não exige nada de mim.

Gladir Cabral e João Alexandre cantam isso como ninguém:
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Amigo Vento - Gladir Cabral - CD Claridade
O Vento - Gladir Cabral - CD Cantos e Sonhos
O Vento - João Alexandre - CD Acústico

5 comentários:

  1. Lindo, Tuco!

    Obrigado por esse presente!

    Trilha sonora também tão quão inspiradora quanto o texto.

    Abraços fraternos,

    Roger

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  2. Obrigado por mais esta importante reflexão. Imagino que a tragédia que se abateu sobre a tua região pode ter inspirado um pouco disso.

    Não querendo ser chato, tem um probleminha nos links no final - para as páginas dos dois músicos. Acontece sempre que digitamos um endereço na ferramenta de edição de postagens, que corrompe o endereço digitado adicionando um www.blogger.com no início.

    A solução é entrar na página desejada, copiar a URL e colar na ferramenta de edição, o que evita o problema.

    Abraço,

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  3. Manoel Barros confessou em um de seua versos que "quis uma vez implantar uma costela no vento. A costela não parava nem." Se ele caminhasse na Palestina do primeiro século toparia surpreso com um vento de costela.

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  4. A tragédia inspirou muitas coisas, André. Coisas demais.

    "Vento de costela" é um adjetivo e tanto! :-)

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  5. Valeu Roger. Obrigado.

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