18 de fevereiro de 2010

Um pescador [1]

1. FLASH BACK

Nas últimas semanas, desde que o mestre morreu, irresistíveis flash backs dos últimos 3 anos pipocavam na mente do pescador. Lembrava dos rumores que surgiam sobre um novo e desconcertante rabi que andava às margens do mar de Tiberíades, de onde ele tirava seu sustento. Lembrava do relato de seu irmão narrando-lhe num misto de euforia e apreensão as palavras de João, o batista, quando lhe dissera que esse rabi era o cristo, o profeta esperado, o libertador. André parecia fora de si. Dizia ter visto uma pomba descer sobre ele. Jurava ter ouvido uma voz do céu chamando o enigmático homem de filho amado no momento em que João o batizava.

O quarto mal iluminado onde Pedro passara as últimas semanas já cheirava mal, pelos longos dias com portas e janelas fechadas, e tinha o ar carregado, quente e humido, que o fazia arfar ofegante. Três anos de espectativa intensa pareciam ter desmoronado sobre seus ombros cansados. E pesavam muito, pressionando-o sobre a palha no chão, impedindo-o de levantar.

O mais estranho foram as aparições do rabi depois de ter morrido. Quando as mulheres disseram tê-lo visto vivo, correu como louco na esperança de encontrá-lo, mas viu apenas um túmulo vazio. Quando enfim apareceu na casa onde estava todo o grupo que por três anos o tinha acompanhado, o coração de Pedro disparou, fazendo-o sentir tremores de ansiedade e medo, com as pernas falseando. Olhou fixo nos olhos do mestre, ansioso, esperando palavras suas, esperando trocar olhares, esperando um mínimo de reciprocidade. Mas suas palavras lhe pareceram geladas e distantes, dirijidas a todos indistintamente.

Lembrou dos tantos momentos juntos. Lembrou que entre todos foi o que esteve mais perto. Lembrou-se de ter caminhado sobre as águas, de tê-lo corajosamente chamado de Cristo, da primeira vez em que Jesus o chamou de Pedro, mudando para sempre seu nome. Lembrou-se das muitas vezes em que foi chamado de amigo. Mas sua alma enchia-se de horror e trevas! Sentia um buraco profundo no estômago. Três vezes ele apareceu e em nenhuma delas lhe dirigiu a palavra.

A intimidade havia desaparecido com o terceiro canto do galo.

[...]

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