25 de maio de 2011

Gente enterrada no chão

José Cláudio Riberio da Silva, o Zé Castanha, vivia em Nova Ipixuna, num canto esquecido do Pará. Vivia na floresta e da floresta. Colhia castanhas, fazia cestos, extraía óleos, sustento e alimento da generosidade graciosa e farta da floresta. Mas insistia em denunciar aqueles que, ao redor dele, botavam tudo no chão e faziam impiedosa e gananciosamente da floresta pó.

Terça-feira, 24 de maio de 2011, Zé Castanha e sua esposa foram mortos a tiros por pistoleiros a mando das madeiriras e carvoeiras da região.

Como havia profetizado na sua palestra no TEDx Amazônia, Zé Castanha seguiu os passos resolutos de Chico Mendes e irmã Dorothy e teve o mesmo fim que eles. Até quando?

À nós fica o lembrete, quando formos comprar nossos belos móveis de madeira de lei, que eles podem vir manchados de sangue.

PS: E agora nossos deputados queridos aprovaram o insaciável Novo Código Florestal brasileiro. Três vivas para as madeireiras, agronegócio e a ganância. Impunidade e destruição venceram mais uma.


[Zé Castanha] tá de prova
Naquele lugar tem cova
Gente enterrada no chão



Saga da Amazônia
Vital Farias

Era uma vez na Amazônia, a mais bonita floresta
Mata verde, céu azul, a mais imensa floresta
No fundo d'água as Iaras, caboclo lendas e mágoas
E os rios puxando as águas

Papagaios, periquitos, cuidavam das suas cores
Os peixes singrando os rios, curumins cheios de amores
Sorria o Jurupari, Uirapuru, seu porvir
Era fauna, flora, frutos e flores

Toda mata tem caipora para a mata vigiar
Veio caipora de fora para a mata definhar
E trouxe dragão-de-ferro, prá comer muita madeira
E trouxe em estilo gigante, prá acabar com a capoeira.

Fizeram logo o projeto sem ninguém testemunhar
Prá o dragão cortar madeira e toda mata derrubar:
Se a floresta meu amigo tivesse pé prá andar
Eu garanto meu amigo, com o perigo não tinha ficado lá.

O que se corta em segundos gasta tempo prá vingar
E o fruto que dá no cacho prá gente se alimentar??
Depois tem passarinho, tem o ninho, tem o ar
Igarapé, rio abaixo, tem riacho e esse rio que é um mar.

Mas o dragão continua a floresta devorar
E quem habita essa mata prá onde vai se mudar??
Corre índio, seringueiro, preguiça, tamanduá
Tartaruga, pé ligeiro, corre-corre tribo dos Kamaiurá

No lugar que havia mata, hoje há perseguição
Grileiro mata posseiro só prá lhe roubar seu chão
Castanheiro, seringueiro já viraram até peão
Afora os que já morreram como ave-de-arribação
Zé da Nana tá de prova, naquele lugar tem cova
Gente enterrada no chão

Pois mataram índio que matou grileiro que matou posseiro
Disse um castanheiro para um seringueiro que um estrangeiro
Roubou seu lugar

Foi então que um violeiro chegando na região
Ficou tão penalizado e escreveu essa canção
E talvez desesperado com tanta devastação
Pegou a primeira estrada sem rumo, sem direção
Com os olhos cheios de água, sumiu levando essa mágoa
Dentro do seu coração.

Aqui termina essa história para gente de valor
Prá gente que tem memória muito crença muito amor
Prá defender o que ainda resta sem rodeio, sem aresta
Era uma vez uma floresta na linha do Equador

5 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Estarrecedor que depois de Chico, Dorothy e outros tantos, ainda existam assassinatos encomendados pelos poderosos para eliminar quem se opõem à ganância estúpida!!!

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  3. partiu meu coração
    partiu de nós
    partiu mais um Zé
    :(

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  4. Rondinelly11:25 AM

    "De nada vale tanto esforço do meu canto
    Pra nosso espanto tanta mata haja vão matar"

    http://letras.terra.com.br/xangai/385821/

    Mantemos alguma esperança...

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  5. A esperança é a última que morre Rondinelly. Mas morre, a miserável. Resta saber quanto tempo ainda dura...

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