Pavor
O grupo reunido no salão da igreja deliberava sobre formas de aumentar a produção. Haviam chamado um técnico da cidade que viera para analisar a situação. Já era tarde e a longa discussão na cooperativa manteve grande parte da cidade acordada na expectativa dos resultados das complexas pesquisas que o técnico fizera nos últimos dias. Talvez a tensão da situação difícil em que se encontravam e o avançado da hora tenham feito com que aquele grito parecesse mais agonizante do que realmente foi. O fato é que berro fez-se ouvir por quase toda a vila. Todos sentiram nos pelos da nuca o pavor que o acompanhava. Crianças correram apavoradas em direção às mães que as abraçaram como que protegendo de perigo iminente. Muitos correram para as portas e janelas tentar vasculhar a origem do berro. Outros saíram desvairados pelas ruas e campos e florestas movidos pela angustia que lhes imprimiu tão apavorante som. Os que se cruzavam pelo caminho tentavam arrancar informações uns dos outros. Os homens da cooperativa é que puderam indicar a origem do som com mais precisão. Vinha de perto deles e havia certamente entrado pelas janelas voltadas para o leste. Correram apressados nessa direção, que levava diretamente ao pasto dos bois. Quando chegaram lá, encontraram Ernst, sentado no mesmo local onde tantas vezes fora encontrado. O pequeno trazia estampado nos olhos o mesmo pavor que emergiu daquele grito. À luz de lanternas, a única coisa que encontraram ali além do rapaz foram marcas circulares no pasto.
Ficou evidente para todos que o grito veio do rapaz. Seus olhos diziam isso, apesar de ninguém ter conseguido arrancar-lhe mais nenhum som. Naquela mesma noite, e em todo dia seguinte, um grupo de homens vasculhou o local e áreas próximos atrás de algum rastro de outro elemento que pudesse ter estado lá, mas sem sucesso. Acharam por bem não divulgar a história, para que não chegasse aos ouvidos de ninguém além dos moradores. Decidiram retornar à rotina e tentar recuperar o ar pacato do local através do silêncio coletivo. Poucos dias depois, porém, os pesquisadores apareceram no local. Trouxeram uma série de aparelhos e vasculharam novamente todo o pasto monitorando cada centímetro com máquinas indecifráveis. Enquanto vasculhavam, Ilmar apareceu sorrateiro para acompanhar o movimento. Olhava de longe quando percebeu que o som constante dos aparelhos alterou o bastante para chamar a atenção da equipe. Enquanto o grupo tentava descobrir a origem da alteração, Ilmar afastou-se discretamente, sem ser percebido, ocultando-se entre arbustos. As máquinas, no entanto, permaneceram alteradas e, sempre que eram apontadas na direção dos pequenos arbustos, oscilavam com maior intensidade. A equipe deslocava-se na direção de Ilmar apreensiva e excitada. Como ainda estavam distantes, o homem conseguiu deslocar-se discreto até a floresta e bater em rápida retirada sem ser visto. O som das máquinas voltou a ser constante e inalterado.
Antes:
O campo dos Wagner [1] - Aparições
O campo dos Wagner [2] - O pequeno
0 comentários:
Postar um comentário